Sócia da Juchem Advocacia compartilha percepções sobre tendências em ESG e mudanças climáticas, e comenta sua participação na COP 28, em Dubai, no 2023 Public Forum da OMC, em Genebra, e na Conferência anual da IBA, em Paris
Com sua experiência de 30 anos em Direito Ambiental e de 20 anos em Direito do Clima, e sua atuação de destaque em temas ESG, a sócia Alessandra Lehmen desempenhou papel de destaque em diversos eventos globais em 2023. Alessandra participou de discussões cruciais e contribuiu ativamente para a formação de diretrizes que impactarão o futuro do planeta e dos negócios.
Em 2023, Alessandra palestrou em vários eventos internacionais de destaque. Na 28a. Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas da ONU (COP 28), em Dubai, foram 5 painéis sobre comércio internacional, greenwashing, poluição por plásticos, oceanos, biodiversidade e a importância da advocacia para o enfrentamento às mudanças climáticas. No 2023 Public Forum da OMC, em Genebra, Alessandra falou sobre comércio internacional e litigância climática transnacional, e, na Conferência Anual da IBA, em Paris, sobre Direito e ESG.
Na entrevista a seguir, Alessandra compartilha suas percepções em primeira mão sobre tendências em práticas ESG, ações relacionadas a mudanças climáticas e impactos jurídicos e empresariais desses temas cada vez mais importantes:
COP 28
– Do seu ponto de vista, quais foram os principais temas discutidos e as tendências observadas durante a COP28?
Um dos principais pontos foi o fato de o texto do Global Stocktake (balanço global, ou GST), depois de muita disputa, idas e vindas diplomáticas e pressão de Estados-partes e da sociedade civil, falar, no parágrafo 28.d, em “transitioning away from fossil fuels” (transição para não utilização de combustíveis fósseis A expressão é menos contundente que phase-out (eliminação gradual), mas é a primeira e histórica menção expressa ao tema em um documento final de COP. O GST era um tema-chave da COP28, por ser o primeiro realizado sob o Acordo de Paris. A partir da avaliação dos avanços até agora, o GST informará as novas contribuições nacionalmente determinadas (NDC) a serem apresentadas pelos países até a COP30, em Belém. O documento admite o uso de “transitional fuels”, ou combustíveis de transição (gás, por exemplo), mecanismos de captura, utilização e armazenamento de carbono (CCUS) e não inclui metas de curto prazo.
Financiamento é sempre outro tema fundamental em COP: alguns países em desenvolvimento dizem que abandonar as receitas de fósseis é “suicídio econômico”, e a COP28 pouco avançou no financiamento da transição. Transições só acontecem quando a alternativa é tecnológica e economicamente viável (a decisão de Dubai diz que precisamos do triplo de renováveis e do dobro de eficiência), e isso precisará acontecer em escala global e sem aumento de endividamento para os PED. Reduzir o custo de capital e criar instrumentos financeiros inovadores que envolvam os setores público e privado será crucial.
Uma surpresa veio com o anúncio, já no primeiro dia de COP, da operacionalização do Fundo de Perdas e Danos criado na COP27, no Egito. O fundo será provisoriamente administrado pelo Banco Mundial, e os países desenvolvidos prometeram modestos USD700 mi até o momento.
Houve frustração com as negociações multilaterais de mercados de carbono: se avançou sobre o detalhamento do Artigo 6.2 (transferências entre países) e houve impasse sobre o 6.4 (projetos envolvendo o setor privado), em especial sobre a integridade de remoções, atrasando a discussão para a COP29, no Azerbaijão. Mas houve acordo sobre o non-market mechanism do 6.8. Enquanto isso, o tema vem avançando no Brasil, com a possível aprovação de uma lei criando um sistema de comércio de emissões nacional.
Impacto nos Negócios
– De que maneira as discussões e compromissos na COP podem impactar as estratégias e operações das empresas?
Pelo menos desde a COP26, em Glasgow – a primeira desde a pandemia, e que coincidiu o com o crescimento da pauta ESG –, venho notando um movimento de crescente interesse das empresas na pauta climática. Para mim, a COP26 foi uma “COP de CEOs”, no sentido de que o tema ganhou a atenção do alto escalão das empresas, que passaram a compreender que clima é um tema essencial para a resiliência e a lucratividade dos negócios e a participar mais efetivamente das conferências. Há uma série de temas climáticos muito concretos na agenda das empresas, por exemplo, custos de capital, riscos regulatórios, preferências do consumidor, exigências de investidores, exposição a desastres, escassez de matéria-prima, saúde do trabalhador, obrigações de divulgação e de due diligence, requisitos para exportação, taxonomia de produtos financeiros verdes, mercados de carbono, entre muitos outros. As relações entre clima e comércio internacional também têm dado o que falar: esse foi um tópico (justificadamente) quente na COP28, com a estreia de um dia temático específico, o Trade Day. No WTO Public Forum 2023, da OMC, em Genebra, e na Conferência Anual da IBA, em Paris, pude falar sobre clima e comércio internacional em painéis, que despertaram muito interesse e tiveram lotação máxima. Isso é natural, porque o tema das medidas climáticas unilaterais de comércio tem gerado impactos concretos sobre as cadeias globais de valor e, por consequência, sobre o setor privado.
– Como as organizações estão respondendo às mudanças climáticas em termos de sustentabilidade e responsabilidade ambiental?
Essas questões exigem conhecimento especializado e transversal, que não se constrói da noite para o dia, e por isso as empresas vêm investindo fortemente em capacitação e consultoria. Também existe uma tendência de maior engajamento de investidores sobre esses assuntos, e, portanto, é necessário que as companhias as empresas tenham políticas claras sobre o tema. Um ponto importante, no que diz respeito à estratégia climática das organizações, é o “tone at the top”: é importante que a alta administração esteja efetivamente envolvida com a pauta, e é cada vez mais desejável que executivos e conselheiros tenham expertise nesse e em outros temas da agenda ESG. Estudos em outros mercados mostram que isso ainda está longe de ser uma realidade, mas, na minha opinião, é algo que veio para ficar.
Sustentabilidade
– Como as empresas podem se beneficiar economicamente ao adotarem práticas de sustentabilidade?
As empresas que chegam cedo, chamadas de first movers, têm vantagens competitivas. Os padrões de divulgações ESG e climáticas – tanto voluntários, como o IFRS S1 e S2, quanto emanados dos reguladores -, têm foco tanto em riscos quanto em oportunidades. Inovação em produtos e processos, eficiência energética, acesso a crédito mais barato e a mercados, resiliência a desastres, bom relacionamento com investidores, governo e outros stakeholders, acesso a recursos naturais e a mão-de-obra, compliance regulatório – tudo isso depende de políticas de sustentabilidade robustas.
Regulação ESG e climática
– Atualmente, que estratégias são mais efetivas e indicadas para que as empresas enfrentem as mudanças climáticas e se adaptem à crescente regulação ESG?
Há ações coletivas e individuais. No nível coletivo, há movimentos setoriais para a adoção de determinados padrões de conduta. No âmbito das negociações internacionais, temos visto o recrudescimento de acordos plurilaterais: “coalitions of the willing” envolvendo governos, associações do setor privado e empresas para aumentar a ambição em temas específicos, como, por exemplo, fósseis, agricultura, desmatamento, renováveis e nuclear, natureza, saúde, metano e indústria. No âmbito individual, as empresas têm investido em capacitação e buscado se assessorar adequadamente para garantir o atendimento a obrigações cada vez mais complexas. Outro ponto importante é que existe uma tendência a que aspectos que eram de adoção voluntária se tornem cada vez mais regulados, e que mesmo as iniciativas voluntárias sofram maior escrutínio por parte dos stakeholders. Isso reforça a necessidade de atenção e de governança adequada de fatores ambientais e climáticos.
Desdobramentos Jurídicos
– Quais as principais decisões e acordos realizados durante a COP 28 (ou outras discussões recentes) que estão impactando ou prometem impactar mais o universo jurídico?
Advogados e juristas de clima, individualmente e por meio de nossas ordens e associações, temos ocupado espaços cada vez mais importantes nas COP. Existem dias inteiros de discussões jurídicas nas COP, que podem se tornar um dia temático específico (Legal Day) para questões jurídicas, a exemplo do que já existe para outros temas climáticos. Atuo em Direito do Clima há 20 anos e tenho representado a OAB/RS em COP desde 2018, na COP 24. Naquela época, a participação de advogados era tímida, mas isso mudou: as mudanças climáticas se tornaram uma pauta importante para os clientes, e, portanto, para os escritórios. É uma área muito particular, diferente do Direito Ambiental tradicional, que exige conhecimentos específicos e domínio de questões científicas e econômicas. Outro ponto importante é que as questões jurídico-climáticas são transversais a outras áreas do Direito, influenciando, por exemplo, os mercados financeiro e de capitais, o comércio internacional e até mesmo questões concorrenciais.
Também é fundamental lembrar que os textos negociados multilateralmente nas COP são documentos jurídicos, que geram obrigações para os países e que não se desenvolvem no vácuo: para cumprir as obrigações assumidas sob o Acordo de Paris, os Estados Partes editam normas internas, direcionadas ao setor produtivo doméstico. Outras obrigações têm cunho transnacional: a União Europeia, por exemplo, tem editado uma série de normas (antigreenwashing, antidesmatamento, de due diligence ESG, entre outras) que impactam as cadeias globais de valor. Para um país como o Brasil, que é grande exportador de commodities, isso tem um impacto bastante significativo, e obriga o setor produtivo a se adaptar e reorganizar. Nós, advogados, temos papel fundamental para ajudar as empresas a promover compliance com essas obrigações cada vez mais complexas e a aproveitar as muitas oportunidades associadas a essa pauta.
A Juchem Advocacia orienta e apoia empresas para que naveguem com segurança por esse cenário em constante evolução. O conhecimento e a experiência de Alessandra Lehmen contribuem significativamente para essa missão, garantindo que as organizações estejam preparadas para os desafios e oportunidades da pauta ESG e climática.
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